Hoje é dia 08 de março de 2001, dia internacional da mulher, e você, Amanda, está completando 17 dias. Escrevo como se estivesse falando com você, embora nem saiba quando você vai ler isso. Nos dias de hoje, escrevo num editor de texto de uma empresa americana chamada Microsoft, editor este chamado Word, na sua versão 6.0. O nosso computador é um Pentium III, com 300 Mhz de clock, com disco de 10 Gigabytes e memória de 32 Mb. Sabe Deus qual é o padrão de mercado doméstico quando você estiver lendo isto…
Nosso presidente é Fernando Henrique Cardoso, do partido PSDB, e nossa moeda é o real (R$). O salário mínimo é R$ 151,00, nossa inflação está é menos de 1% ao mês, e um dólar vale dois reais. O Brasil é quatro vezes campeão do mundo em futebol (1958,1962,1970 e 1994), temos o melhor tenista do mundo (Gustavo Kuerten), a Estação Espacial está sendo construída, nossa maior velocidade para conexão doméstica a Internet é de 56 Kbps e o Flamengo acaba de se sagrar campeão da Taça Guanabara 2001.
Você nasceu no inverno da região Norte. Dias de muita chuva, chuva constante. Embora tenhas nascido no dia 20/02, acompanhada pelo médico Alessandro Jacob Lobato, somente no dia 21 a tardinha saímos (eu, você e sua mãe) do hospital. E saímos embaixo de um “toró” danado. Será que no momento em que leres isso, as pessoas ainda chamam chuva forte de “toró”? Sabe Deus…
Mas como dizia, ao saírmos da maternidade, o IMAI (Instituto Materno Infantil) chovia a cântaros. Chuva forte mesmo. Entramos no nosso carro (tínhamos então um carro da Volkswagen, um Logus azul, ano 94. Queira Deus que ao leres isso tenhamos um carro mais novo…), e fomos pra casa, mas bem devagar. Sua mãe estava operada (afinal, tinha dado a luz a você!), e a passagem em cada buraco, lombada ou desnível era um sofrimento para ela.
Seus avós maternos, Olivar e Sueli, nos esperavam em casa, junto com sua irmã Glória. Talvez hoje tenhas outros irmãos além dela, mas na época era somente ela, então com três anos e meio. A chuva era muito forte, e nosso apartamento não tinha garagem (tomara que tenhamos uma hoje…), então lembro que tive que subir com o carro na calçada, chegando o mais perto possível da porta, para que sua avó aparasse você e sua mãe com um guarda-chuva, e assim ela o fez.
Eu não podia deixar o carro ali, e fui obrigado a voltar a rua, e por falta de vaga, tive que dar uma volta no quarteirão para conseguir uma. Por causa disso, não pude subir as escadas com sua mãe (morávamos então num apartamento próximo a Praça Brasil, que não tinha elevador.), e consequentemente não pude entrar em casa junto com vocês duas. Isso foi muito chato, e sua mãe ficou magoada pelas coisas terem ocorrido assim.
Na primeira noite em casa, sua vó Suely ficou conosco. Foi uma grande ajuda, pois sua mãe passou muito mal nesta primeira noite. Já completavam pelo menos três dias que sua mãe não dormia direito, e a anestesia aplicada nela foi muito dolorosa. Por conta da anestesia, sua mãe passou praticamente um dia se coçando no hospital, como efeito colateral da morfina. Sua mãe sofreu um bocado para que você nascesse. Nunca esqueça disso.
Sua mãe sentia dores, passava mal, não conseguia dormir, sentia mal-estar, enfim, ficou bem “baqueada”. No outro quarto, sua irmã Glória estava com dor de estômago e acabou por vomitar quando sua vó Suely saía com ela do quarto para pegar álcool. Foi um momento complicado, sua irmã e sua mãe passando mal. Mas Deus ajudou muito, e na hora do sufoco, enquanto eu limpava o chão e sua avó “pajeava” as duas, você ficou tranquilamente deitada sozinha no sofá da sala… sem nem ventilador…
Ligamos para o obstetra da sua mãe, ligamos para o Roni, irmão da sua vó que é médico, e saí no meio da madrugada para comprar um remédio para sua mãe, um tal de Spidufen 600, um analgésico. Agora imagina sua vó, comigo na rua, e com vocês três nesta situação… mas ela “segurou o rojão”…
Após tomar o remédio, sua mãe melhorou e conseguiu dormir um pouco. Sua irmã melhorara também, e estava dormindo, junto com sua vó. Aí, minha preocupação passou a ser você, pois você tinha mamado lá pelas 11 da noite, já eram quase duas da manhã e receava que você chorasse de fome ou por ter sujado suas fraldas. Mas com a ajuda de Deus e dos espíritos amigos (papai é simpatizante do espiritismo, você já deve saber disso hoje…), durante todo o tempo que sua mãe dormiu (e ela dormiu bem, até por volta de umas seis e meia…) você ficou quietinha no seu carrinho, embora não comesse há horas e estivesse toda sujinha de cocô… Você deu uma ajuda e tanto, filha!!!
Você nasceu numa terça-feira, terça de uma semana que antecedia o carnaval. Por causa do fim de semana prolongado, tinha preocupação de precisarmos de algum apoio médico, e não encontrarmos ninguém. Não chegou a ser um grande problema, mas isso acabou acontecendo.
Como nos seus três primeiros dias em casa você pegou sol somente por uns vinte minutinhos, por causa das insistentes chuvas do mês de fevereiro, na sexta-feira começamos a achar que você estava “amarelinha”, o que poderia ser sinal de icterícia. Na dúvida, sua mãe ligou para a Dra. Denise (que por causa do feriado já estava na estrada, indo para a praia…), sua então futura pediatra, já que até então você não tinha ido ao consultório dela, descreveu nossos temores e ela recomendou levar a um médico.
Fomos a uma clínica “Instituto Saúde da Criança”. Olha lá de novo você saindo embaixo de chuva, no final da tarde de sexta-feira, com menos de 100 horas vividas… Mas o pior estava por vir: depois de examinar, a doutora ficou na dúvida e achou melhor fazer um exame de sangue. E lá foi você, filha, com seu braço fininho (quando você nasceu, seu antebraço era do tamanho do meu dedo indicador…), tirar sangue. A funcionária pediu para eu sair da sala, e só ouvi seu choro. Você chorou tanto, que ficou rouca e quase desfaleceu. Quando saiu da sala, sua mãe chorava muito, só de ver seu sofrimento.
Viemos pra casa, e foram horas de espera angustiante, pois um resultado ruim do exame faria com que tivéssemos que internar você, para levar um banho de sol artificial. Mas as 22:30 sua mãe ligou, e estava tudo bem. Puxa, você não sabe como ficamos aliviados. Passamos bem o carnaval. Em tempo: no ano que você nasceu, a Imperatriz Leopoldinense sagrou-se tri-campeã do carnaval carioca. Tri-Campeã autêntica, 1999,2000 e 2001. É a escola de samba da região onde seu pai nasceu no Rio de Janeiro, a zona da Leopoldina, que engloba entre outros bairros Bonsucesso, onde seu pai nasceu e viveu por vinte anos.
Nesse momento em que escrevo isso, seu avó paterno, meu pai Luiz, está se recuperando de um derrame, ocorrido ainda durante o período da sua gravidez. Quando aconteceu, em novembro de 2000, tive que viajar ao Rio de Janeiro para dar uma assistência a ele, a minha madrasta e a suas tias, Marli e Marluce, e foi um afastamento muito sentido. Mas sua mãe ficou por aqui e segurou a barra. Inclusive, a despeito do barrigão, ela ainda arrumou jeito de endireitar o apartamento, inclusive mandando colocar umas portas que havíamos comprado.
A aventura seguinte foram suas primeiras vacinas. Levamos você na Climepe, onde você tomou duas vacinas, uma delas ( a BCG) é esta que você até hoje tem uma marca no seu braço direito, pode olhar. A outra (Hepatite B, 1ª dose) você tomou na perna, pois era mais doída e seu braço ainda era fininho. E fez também o teste do pezinho. Você chorava, filha… E esta sequência (vacinas e teste do pezinho) eu pude ver. A coleta demora, dava uma pena de te ver chorando… Eu e sua mãe só deixamos pois tínhamos plena consciência que era para seu bem.
No dia 02 de março, eu fui ao cartório para registrar você. Como era um serviço gratuito por lei (tomara que ainda seja…), os cartórios distribuíam números, e pronto, acabou, acabou. Fui de manhã e não consegui nada. Sua mãe sugeriu deixar para outro dia, mas como na semana seguinte, dia 05 de março, eu começava um curso da ferramenta de desenvolvimento de sistemas adotada pelo tribunal (Visual Basic 6.0 com SQL Server 7.0), resolvi voltar a tarde, para tentar conseguir registrá-la naquele dia. Só por curiosidade: o que será que estão usando hoje em dia, para fazer sistemas de informática?
Mas, voltando ao cartório: filha, perdoa o papai, mas ô cartóriozinho vagabundo este onde eu registrei você. Sem ar condicionado, zero de informatização, cadeiras de plástico para o público, poucos funcionários, um caos, filha. Mas lá estava eu, do lado de fora, desde as 13:20, aguardando o cartório abrir as 14:00, para tentar pegar um número para poder registrar você. E a chuva ameaçando desabar sobre nossa cabeça…
Abriu a porta, e aí seguiu-se o “pisão”. Como era corpulento (digamos “gordinho”. Será que ainda sou?) e mais alto que a maioria dos outros que estavam naquilo que em determinado momento tinha sido uma fila, consegui pegar o número 6 e ainda arrumar uma cadeira pra sentar. Mas o plástico era tão duro que optei por ficar em pé.
Falando em “optei”, só para informar: neste momento, a cidade onde moramos, Belém, é governada pelo prefeito Edmilson Rodrigues, que foi re-eleito ano passado. Será que ao leres isso, o PT terá conseguido por um dos seus quadros na presidência, ou terá sumido? Hoje, seu momento é de crescimento, tendo conseguido ganhar a eleição em diversas capitais.
Mas, novamente voltando ao cartório: um calor horroroso, papai suando em bicas, sem lugar confortável pra sentar, o mesmo funcionário que recebia os documentos para registro fazia entrega de certidões de óbito e ainda recebia taxas, uma confusão. Mas, depois de alguma espera, fui atendido, preenchi tudo, peguei o protocolo e corri pra casa, onde devo ter tomado meio litro de água. Só pra citar: o cartório ficava em frente ao nosso apartamento.
No dia 03 de março de 2001 eu e sua mãe fizemos um ano de casados. Ìamos sair com você para almoçar, mas depois de tirar os pontos, ela voltou a sangrar um pouco, e adíamos nosso programa.
No dia 07 de março levamos você para sua primeira consulta com sua pediatra, Dra. Denise, na Medical Care. Acabamos de entrar no consultório, já passando das sete da noite, e me impressionei pela excelente qualidade da iluminação. Dois segundos depois faltou energia. Um “apagão” que afetou sete municípios do estado do Pará. Sua mãe a limpou no escuro, e após esperar um pouco, viemos embora. Não sei se você estava com medo da consulta, mas apagar a luz foi um ótimo truque…
Viemos pelas ruas com todos os sinais apagados e com a chuva sobre o teto de nosso carro. Chegamos bem em casa, apesar do sufoco no trânsito. Com uma lanterna que tínhamos no carro, subimos as escadas com muito cuidado. Sim, filha, nosso prédio, além de não ter elevador, não tinha luz de emergência… Lá pelas 20:30 a energia voltou, graças a Deus.
No dia 10 de março, sábado, pela primeira vez você foi ao supermercado, comigo e sua mãe. Fomos ao Yamada Plaza, então um dos grandes supermercados de Belém.
Sua primeira ida ao supermercado, Yamada Plaza
Primeira madrugada que troquei sua fralda
Primeira noite quando sua mãe retomou a faculdade
Resultado do teste do pezinho
Sua primeira consulta de fato