Crônicas da vida – Uma pequena história de justiça e perseverança

Em 29 de maio de 2013, me vi envolvido em um acidente de trânsito, tendo sido batido por trás por um ônibus da empresa Belém Rio. Era um final de tarde absolutamente ensolarado, a via, de mão única, estava seca e trafegávamos sobre asfalto de boa qualidade, com trânsito moderado. Surpreendentemente, o ônibus me bateu por trás, na faixa da esquerda (onde ele não deveria estar) e por três vezes. Três pancadas. Tum, tum, tum.

SAMSUNGEu tinha ido buscar minha caçula Gabriela no curso de inglês, e minha filha Amanda me acompanhava. Ou seja, na hora do acidente, estava com as duas no carro, no banco de trás. Felizmente, nada aconteceu, com elas. Somente um grande susto – “Pai, o que é isso, o que está acontecendo?

Visto que eu respeitava a distância de seguimento, felizmente não bati no carro da frente, apesar do forte impacto pela batida do ônibus. Felizmente também (pelo menos para mim, creio) o ônibus ficou colado na traseira do meu carro. Como eu não movi o meu carro, ele não teve espaço para se mover e nós “travamos” a rua. Os passageiros, forçados a descer, reclamavam em altos brados e das mais diversas formas, bem como o motorista do ônibus, mas eu “finquei pé” – a gente só sai daqui depois da perícia.

Acionei meu seguro, para pegar orientações e principalmente para obter apoio. Apoio físico, presencial mesmo. Os passageiros, a pé, na rua ficavam gritando “vamos embora, foi só uma encostada…“, “segue, cada um fica com seu prejuízo…“, mas eu estava decidido a ficar ali. Fui batido por trás, sob céu claro, em uma via bem asfaltada! A razão estava do meu lado!

Apesar da pressão dos passageiros ir diminuindo (eles foram gradativamente embarcando em outros ônibus da companhia que iam passando pela rua), algumas coisas pioravam – a noite ia caindo e a rua ficava cada vez mais soturna e mal frequentada. Minhas filhas continuavam no carro e comecei a me sentir mal, não sei se pelo nervosismo ou pelo longo tempo sem comer – coisa que devo evitar, por causa do diabetes.

Mas felizmente meu sogro chegou e levou minhas filhas, e a seguradora mandou o Sr. Ricardo para me dar apoio (que ficou comigo no local até o desfecho da ocorrência) e uma viatura da polícia se posicionou em uma esquina próxima. O próprio mal estar da fome aos poucos foi passando.

O pessoal de apoio da empresa de ônibus chegou, e aí sempre fica um clima esquisito – como se fossem dois grupos de animais se estudando e verificando qual a melhor hora de um pular no pescoço do outro.

Mas felizmente em momento nenhum a coisa descambou para briga ou discussão – a situação era tão incontestável que o próprio supervisor da empresa em certo momento me disse que o motorista estava errado. Outrossim, eu tinha e mantinha a minha convicção que, não importa o que ele falasse, eu não moveria o meu carro do local até a chegada da perícia. Mas o supervisor foi muito correto – em momento nenhum ele tentou alguma “esperteza”…
LaudoAcidenteSupervisorBelemRio

O supervisor pediu meus dados para um relatório de controle dele, onde ele fez um croqui e registrou o laudo dele, indicando a responsabilidade do motorista da empresa dele. Conversei com meu corretor e retornei ao supervisor, dizendo que daria os dados, desde que eu ficasse com uma cópia do documento. Na impossibilidade de tirarmos cópias ou “scannear” (já era noite alta, tudo na rua estava fechado – é um trecho ermo da cidade) o supervisor fez uma cópia manuscrita do documento, com tudo (depoimento do motorista, laudo do supervisor, croqui do acidente, etc.). Nestes termos, dei meus dados, mantendo uma cópia do documento comigo.

Várias horas após o acidente, a perícia chegou. Mediu, bateu foto, fez um croqui da situação encontrada, pegou meu depoimento e o do motorista do ônibus, entregou nossas vias com informações para retirada do laudo e nos liberou. Antes de irmos embora, peguei com o supervisor o telefone do gerente de operações e do setor jurídico da empresa Belém Rio, bem como a informação que o mesmo iria imediatamente registrar o boletim de ocorrência. Agradeci ao Ricardo da minha seguradora (Japan Seguradora) e fui embora.

No mundo perfeito, o que iria ocorrer? A empresa de ônibus, munida do laudo do supervisor e do boletim de ocorrência abriria um registro de sinistro em sua seguradora, e eu de posse desse número abriria um registro de “sinistro de terceiro”, faria um orçamento na concessionária, remeteria o mesmo junto com meus documentos e do carro para a seguradora, o orçamento seria autorizado, o serviço seria feito e eu teria meu carro consertado e liberado. Mas o mundo não é perfeito…

A empresa demorou a abrir o registro de sinistro. Sem esse número, eu nada poderia fazer. Liguei para o gerente de operação da empresa, e ele tentou me convencer a fazer o serviço no “Zezinho Lanterneiro” – nome fictício, somente para destilar minha ironia. Meu carro ainda está na garantia, e nunca foi mexido fora da concessionária. Ante minha negativa, ele me disse “assim, vai demorar mais um pouco…“, mas me passou o telefone do setor jurídico da empresa – que eu já tinha.

Liguei para o setor jurídico, e a funcionária ainda não sabia de nada, mas disse que iria tratar com o setor de tráfego, montar o processo e encaminhar para a seguradora. Mas dois dias, novo contato, e agora ela já sabia do assunto, mas não tinha enviado ainda o processo para a seguradora.

Nesse meio tempo, por necessidade de trabalho, tive que ir ao TRT de Alagoas. De lá, com restrições severas de tempo, visto que as “horas úteis” estavam praticamente todas comprometidas com minhas atividades, consegui falar com a corretora, que finalmente tinha aberto o processo de sinistro junto a seguradora, Mas não pude abrir o processo de sinistro de terceiros, pois embora já tivesse digitalizado meus documentos e o do carro, ainda não tinha o meu boletim de ocorrência assinado e digitalizado.

De volta a minha cidade, através do simples mas eficiente sistema da polícia de registro via web de termo circunstanciado de ocorrência, assinei e digitalizei o documento, enviando o mesmo para a seguradora, finalmente conseguindo abrir o meu processo de sinistro de terceiro, junto a seguradora.

ParteDoOrcamentoLevei  meu carro a concessionária, e fiz o orçamento: mais de dez mil reais. Eu sei que tudo é caro em um carro deste segmento, mas até eu me assustei. Foi mais ou menos aí que começaram a “pipocar” os comentários dos conhecidos – “a empresa de ônibus jamais vai pagar este serviço“,”a seguradora jamais vai autorizar fazer o serviço em concessionária“, “a seguradora jamais vai autorizar estas peças todas e essa quantidade de horas de serviço“,”alguma coisa você vai ter que pagar“,etc., etc, etc.

A concessionária entrou em contato com a seguradora, passando os valores e foi agendada uma vistoria. 72 horas para realizar. Dois dias com o carro parado, me gerando despesas com táxi e nada do fiscal aparecer. Na manhã do terceiro dia, a custa de muita reclamação, milagrosamente alguém lembrou que tinha o celular do fiscal, e ao falar com ele pelo telefone, para minha “sorte”, ele estava perto e já estava chegando. Olhou, olhou, bateu foto, falou muito pouco e foi para uma salinha reservada na concessionária para este tipo de profissional – com fax, computador, telefone, etc. Liberado, fui embora, com meu carro batido. Era o dia 17/06/2013 – tinha sido batido há quase vinte dias.

A seguradora da empresa de ônibus possui um site funcional, com um eficiente “Fale Conosco” – mas nenhum telefone de contato. Então era assim: eu fazia uma pergunta, vinte e quatro horas depois eu tinha uma resposta. Uma pergunta, 24 horas, uma resposta. Até que no dia 21/06/2013, o orçamento foi aprovado – parcialmente.

Esse era um assunto a ser resolvido entre oficina e seguradora, mas eu e meu corretor Sasaki tivemos que nos envolver em diversos momentos – alguém seguramente fez o trabalho de alguém. Informações desencontradas, acusações de dificuldade para fazer contato, desconhecimento da engenharia de construção do carro, envio de manual pra lá, manifestação do analista para cá, e somente no dia 11/07/2013 todas as peças solicitadas foram autorizadas. E tenho a íntima certeza que sem minhas diversas ligações para São Paulo, isso não teria ocorrido. Consegui, no corpo de um email, um número de telefone do setor de sinistros em São Paulo, número este que acabou revelando-se muito útil.

Nesta altura, já são passados quase quarenta e cinco dias do acidente.

Como iria fazer uma viagem em família, agendei então para deixar o carro no dia 16/07. Embora agendado, fui avisado pelo meu consultor na concessionária que talvez não pudéssemos começar o serviço, pois ainda havia uma divergência, desta vez, referente a valores de serviços. Nesta hora, minha enorme paciência findou. Falei que eu iria deixar o carro de qualquer jeito no dia 16/07, e que no dia seguinte eu iria conversar com o gerente de manutenção.

Fui recebido pelo Sr. Elias, expliquei toda a minha odisseia e descobri que a divergência era de trezentos e dez reais! Em um orçamento de mais de dez mil, com todas as peças autorizadas, com meu carro batido a mais de quarenta dias, eles não queriam começar o serviço por uma diferença de trezentos e dez reais! Mandei chamar a calculista para nos explicar essa diferença, e na nossa frente, elas não conseguiu chegar nos valores! Dava R$294,00, R$278,00, R$305,00… Finalmente, o gerente Elias disse que “absorveria” essa diferença e que o serviço deveria ser iniciado na data agendada. E assim o foi. Dia 16/07 o carro parou para manutenção.

Viajamos, voltamos e na quarta-feira liguei para o consultor na oficina. “Tudo OK, quinta, no máximo sexta, está liberado. Já estão pintando as peças, aí é só montar e polir.” Liguei na quinta. “Houve um imprevisto, vi um risco na peça nova, mandei tirar e pintar de novo, acho que só no sábado…” Estranhei. Estranhei muito.

Na sexta, por volta das 16:00, liguei e recebi a informação que o carro não seria liberado, pois precisava haver uma “inspeção de qualidade” por parte da seguradora. Enquanto eu falava com a seguradora em São Paulo, meu corretor Sasaki tratava com conhecidos na oficina e na corretora local, para realmente descobrir o que estava acontecendo.

A seguradora em São Paulo me esclareceu que a inspeção de qualidade é uma prerrogativa minha, e não da seguradora, e não havia mais pendências, seja de peças ou valores. Se o carro estava pronto, não havia impedimento em liberar o carro e remeter a documentação para São Paulo, para procedimentos de pagamento. Tal informação, pós contato telefônico, foi formalizada via correio eletrônico para todos os envolvidos.

Praticamente ao mesmo tempo que meu corretor me explicava que somente na sexta as 15:00 a corretora local acionou a empresa de ônibus para pagamento da parte que a ela compete (a “franquia”), recebi um email do consultor da oficina, onde no corpo da mensagem, a senhora Elizabeth, corretora local, informava que havia cobrado da empresa de ônibus, as 14:00 de sexta-feira, o pagamento da franquia pela mesma.

Aí a coisa se esclareceu: a concessionária não queria liberar o meu carro como garantia que não levaria um calote da empresa de ônibus!!!

Resolver algo em uma sexta-feira de julho na minha cidade é muito difícil, pois quem pode já começa a se mandar para os balneários tão cedo quanto possível. Mas meus contatos telefônicos (pelo menos aqueles onde obtive sucesso…) se estenderam até 18:30, com ponderações daqui e dali, todo mundo me dando razão mas ninguém resolvendo nada, quando depois de muita pressão e inquisição, eu ouvi de uma funcionária, de uma forma polida mas firme, sem risco de má compreensão, que o carro ficaria retido até o pagamento da franquia, que estava prometido pela empresa de ônibus da acontecer até quarta-feira. O assunto acabou aí, e eu apenas disse: “amanhã eu vou retirar meu carro.

SAMSUNGManhã de sábado, dia 27/07/2013, eu e minha esposa pegamos um táxi (mais um recibo guardado – desde o início, eu estava decidido que caso eu tivesse algum prejuízo, eu iria “arrancar” de alguém um Fiat Palio de indenização, fora os danos morais…) e fomos para a concessionária, com o espírito armado para o conflito.

Mas felizmente aconteceu tudo ao contrário: desde o meu primeiro contato com o consultor (quando anunciei “Quero ver o carro e quero falar com a Sra. Satomi“), notei logo que o carro seria liberado. Bom senso ou juízo, mas algo aconteceu nas horas que antecederam minha chegada. O carro estava na lavagem e polimento, e os papéis de liberação já estavam todos prontos, aguardando somente nossa assinatura. Tudo correu normalmente.

Alias, quase tudo – já com os documentos assinados, fui olhar novamente o carro e ele estava com a parte de baixo desmontada. Visualmente, uma coisa assustadora. Parece que o carro estava todo por ajeitar. Tinham remontado com a peça batida! Justamente uma das peças que tanto demandou troca de informação entre oficina e seguradora, para ela entender o que era, e autorizar! Mas como é somente um “borrachão” de fixação e acabamento de outras peças visíveis, foi rapidamente remontado.

60 dias depois, o carro está consertado. Me consumiu tempo, energia, me gerou inconvenientes, mas foi consertado da melhor forma possível, sem ônus material para mim. Aconteceu da forma que muita gente julgou impossível.

Dois pensamentos para dividir com você, que teve a paciência de ler toda esta pequena história de justiça e perseverança:

1) Tenha fé em Deus e na justiça, e tenha sempre a razão do seu lado – isso vai te dar força, firmeza e argumentos para enfrentar as questões que porventura surjam no curso da solução do problema.

2) Acredite no que diz quem vive nos polos do planeta – não há noite que dure para sempre. Pode levar seis meses, mas um dia ela acaba…

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