Encontro com o escolhido

            Ele viu aquele homem sentado na beira do rio. Brincava displicentemente com um graveto, como que escrevendo coisas na terra. Ele achou curioso aqueles pássaros amontoados, aquelas borboletas sobrevoando, a marola quase respeitosa que vinha de encontro às pedrinhas que compunham o arrimo daquela beira. 

            Uma paz quase divina parecia emanar daquele homem. Um jeito sereno de mover o graveto, como que acariciando a terra. Parecia que todos estavam felizes por ele estar ali. Todos. Até as pedras. Era como um velho conhecido. 

            E então ele se aproximou deste homem. O homem levantou os olhos, e com um discreto gesto de cabeça, induziu-o a sentar. O homem abriu um sorriso franco, receptivo, o que fez ele sentir-se seguro e tranquilo. 

            Ele perguntou ao homem o que ele fazia ali, e ouviu dele que estava apenas observando. Era muito difícil para ele estar por ali, daquela forma, envolvia grandes preparativos antes da viagem, e ele queria aproveitar o máximo daquela estada. E nada melhor que a contemplação para isto. 

            Ele perguntou porque era tão difícil para ele vir aqui. O homem respondeu que havia muitas diferenças entre aqui e o lugar onde ele vivia, diferenças difíceis de descrever. O ar, o chão, tudo. Até o corpo era diferente. 

            Ele começou a achar que seu interlocutor era meio maluco. Não parecia ameaçador, muito pelo contrário, passava uma afabilidade impressionante, mas devia ser meio “ruim da idéia”. Ele pensou que o homem acabaria dizendo que era de outro planeta e estava num intercâmbio galático… 

            Enquanto ele pensava, o homem respondeu que era da Terra. Mais do que ele poderia entender. Mas que deixaria de ser em breve. Intrigado, ele perguntou se o homem iria morrer. O homem riu, e disse que não, apenas estaria passando uma tarefa para outro. Mais confuso ainda, ele fez uma expressão típica de não entendimento. 

            Então o homem disse que olhava este planeta há muito tempo. Que viu as montanhas nascerem, pouco depois da massa cósmica se condensar. Que viu quando os homens coloridos foram designados para nascer neste planeta, e como eles se desgarraram e se mataram. 

            Que viu os continentes se descolarem, e o gelo avançar até o mediterrâneo, que era todo o mundo que se conhecia. Que viu as batalhas entre irmãos nas Cruzadas. Que viu o renascimento. A penicilina. A bomba atômica. A guerra química. Mas que viu também muito amor, e agora via o alvorecer de uma nova época no planeta. 

            Ele resolveu se levantar e ir embora. Ficou pensando que era apenas mais um maluco. Jamais encontraria com alguém assim na beira de um rio urbano. Quando olhou pra trás, o homem não estava lá. A grama não parecia amassada, os pássaros haviam revoado, só a marola continuava. Mas já não mais tão respeitosamente…

Esta entrada foi publicada em Sem categoria. Adicione o link permanente aos seus favoritos.

Deixe um comentário