Sou um homem simples, de hábitos conservadores.
Frequentava o mesmo barbeiro há quase duas décadas, mas o mesmo infelizmente faleceu.
O filho assumiu o ponto mas, policial militar lotado no interior, nem sempre está disponível.
Com o cabelo beirando o impenteável, minha esposa disse – “Porque você não vai no salão da academia ?”
E assim, enquanto minha esposa e minha caçula faziam uma “escova”, fui cortar o cabelo.
O primeiro impacto foram as cinco TVs de LED agitando o ambiente, passando programação da TV paga – no “meu” salão, é uma TV de tubo, que só pega o sinal da Bandeirantes, exibindo sempre aqueles programas “mundo cão”, e isso com muita chiadeira.
Depois me oferecem água, café ou capuccino – no “meu” salão, é água gelada em copo de geleia, que a gente mesmo pega em uma velha geladeira azul.
A lavagem do cabelo é com água quente, com dois xampus diferentes, em uma cadeira tão confortável que eu dormiria nela – no “meu” salão, é um borrifador.
Distraído, me assusto com o profissional cortando excessos na sobrancelha – no “meu” salão, fora o cabelo, só pelo do nariz. E a pedido…
A conversa trata da execução do brasileiro na Indonésia, e sobre as peculiaridades do sistema judicial daquele país – no “meu” salão, falamos sobre futebol. As vezes, falamos de futebol também. E, vez ou outra, sobre futebol.
As revistas são todas sobre decoração, arquitetura, moda e saúde – no “meu” salão”, são revistas masculinas. E o caderno “Polícia” do jornal popular.
Próximo ao final, cremes, géis, aerossóis e outras coisas, para “dar um aspecto natural ao cabelo” – no “meu” salão, é Leite de Rosas. Quanto mais arder, melhor.
Começo a achar que devo rever meus conceitos, me desapegar dos ranços machistas e ceder ante a modernidade e a qualidade.
Aí vem a conta – cinco vezes o preço que costumo pagar.
Mês que vem, volto ao “meu” salão.